Riscos climáticos: o novo campo de batalha das finanças corporativas

Do risco financeiro ao risco planetário: como a Climate4 Finance está integrando ciência climática, dados geoespaciais e modelagem quantitativa para transformar o risco climático em inteligência estratégica e vantagem competitiva na nova economia regenerativa.

RISCOS CLIMÁTICOS

Eduardo Colafêmina

10/6/2025

car on body of water
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O conceito de risco sempre foi o coração das finanças. Historicamente, aprendemos a calcular, precificar e administrar incertezas — de variações cambiais a oscilações de mercado. Contudo, o século XXI impôs um tipo de risco que desafia essa tradição: o risco climático. Ele não se enquadra nos modelos clássicos de probabilidade, não respeita fronteiras setoriais e, sobretudo, não pode ser diversificado. Está em toda parte — no preço da energia, na produtividade agrícola, nas cadeias de suprimentos e nos fluxos de capital global.

As mudanças climáticas deixaram de ser um tema ambiental para tornar-se um vetor financeiro sistêmico. Os eventos extremos se multiplicam em frequência e intensidade, afetando desde pequenas comunidades agrícolas até conglomerados industriais. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, 2023) alerta que quase metade da população mundial já vive em contextos de vulnerabilidade climática elevada. A OCDE projeta que os danos econômicos causados pelo aquecimento global podem ultrapassar 10% do PIB mundial até o fim do século. Esses números não são apenas estatísticas: são o retrato de uma nova era de riscos econômicos, em que o clima se torna o principal fator de instabilidade de longo prazo.

Dentro das instituições financeiras e corporativas, essa transformação exige um novo olhar. O risco climático não se limita à possibilidade de enchentes ou secas que interrompem operações — ele redefine o conceito de valor e a própria noção de segurança financeira. O Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD) foi pioneiro em sistematizar esse entendimento, distinguindo dois grandes grupos de riscos: os físicos e os de transição. Os primeiros dizem respeito aos impactos diretos das mudanças no clima, como eventos extremos ou variações graduais de temperatura. Já os segundos estão ligados às mudanças estruturais necessárias para adaptar-se a uma economia de baixo carbono — novas regulações, tecnologias, hábitos de consumo e, consequentemente, transformações profundas na precificação de ativos.

Esses dois tipos de riscos interagem em cadeia. Um desastre ambiental pode acelerar políticas regulatórias, desvalorizando ativos intensivos em carbono, enquanto mudanças políticas podem redistribuir investimentos entre setores, criando distorções e oportunidades inesperadas. O resultado é uma interdependência complexa que desafia a contabilidade convencional e exige ferramentas analíticas mais sofisticadas.

Nos últimos anos, essa agenda deixou de ser voluntária para se tornar mandatória. O International Sustainability Standards Board (ISSB), sob a Fundação IFRS, consolidou um novo padrão global de reporte de riscos climáticos (IFRS S2), integrando as recomendações do TCFD, SASB e CDSB. Em paralelo, o Network for Greening the Financial System (NGFS) — consórcio formado por mais de 130 bancos centrais — vem elaborando cenários climáticos que orientam políticas monetárias e regulatórias em todo o mundo. No Brasil, o Banco Central, a CVM e a Susep já incorporaram o risco climático à regulação prudencial, reforçando a necessidade de mensuração e transparência.

Essa mudança marca o início de uma nova governança financeira. As empresas precisam não apenas entender o que está em jogo, mas quantificar o impacto climático sobre seus ativos e operações. E aqui entra um novo campo de conhecimento: a inteligência climática financeira, que transforma dados ambientais em indicadores econômicos concretos. É exatamente nesse ponto que a Climate4 Finance atua.

Por meio do C4 Risk Lab, nosso núcleo de pesquisa aplicada, desenvolvemos modelos que combinam ciência climática, econometria e geotecnologia para quantificar e antecipar impactos financeiros decorrentes das mudanças climáticas. Utilizamos dados orbitais, séries temporais históricas e simulações baseadas em cenários do IPCC e do NGFS para estimar riscos físicos e de transição em nível regional, setorial e operacional. Essa abordagem permite mapear vulnerabilidades, projetar perdas potenciais e identificar oportunidades de mitigação e investimento sustentável.

A modelagem de riscos climáticos é tanto um exercício técnico quanto estratégico. Por um lado, requer metodologias robustas — como regressões geoespaciais, stress testing climático e integração de dados de sensores remotos. Por outro, exige visão econômica, capaz de interpretar o impacto climático dentro das lógicas de mercado, crédito e governança. A Climate4 Finance atua exatamente nessa interseção, traduzindo a linguagem da ciência do clima para a realidade da decisão financeira.

É nesse contexto que o risco climático se revela não apenas uma ameaça, mas também um motor de inovação. A crescente demanda por instrumentos financeiros que incorporem variáveis climáticas tem impulsionado novos mercados: derivativos climáticos para cobertura de eventos extremos, títulos verdes e sustainability-linked bonds para financiar transições de baixo carbono, e seguros paramétricos que automatizam indenizações com base em dados meteorológicos. Essas inovações representam a convergência entre finanças quantitativas e sustentabilidade — um terreno fértil para a criação de valor e para a redefinição das métricas de risco.

A governança corporativa, por sua vez, está sendo redesenhada. Conselhos de administração e comitês de risco começam a incluir o tema climático em suas pautas permanentes. O risco climático deixou de ser uma preocupação de departamentos ambientais e passou a integrar a arquitetura estratégica das organizações. As empresas que internalizam essa dimensão ganham vantagens competitivas reais: reduzem custos de capital, ampliam o acesso a investidores institucionais e fortalecem sua reputação diante de reguladores e consumidores.

A negligência, por outro lado, tem custo elevado. O Banco Mundial (2023) estima que o Brasil já perde mais de R$ 160 bilhões por ano em função de desastres naturais e eventos extremos, valor equivalente a 1,5% do PIB. Setores como energia, logística e agronegócio são particularmente vulneráveis, e as interrupções de produção têm efeitos multiplicadores sobre o emprego e o crédito. Globalmente, a OCDE projeta que a inação climática poderá causar danos comparáveis às grandes crises financeiras da história moderna. Ignorar o risco climático é, portanto, um erro de avaliação com consequências econômicas profundas.

Mas há outro caminho — um caminho que transforma incerteza em inteligência e vulnerabilidade em vantagem estratégica. A Climate4 Finance nasce com essa visão: integrar o rigor científico da modelagem climática à precisão analítica das finanças quantitativas. Através do C4 Risk Lab, apoiamos empresas e instituições na criação de modelos que traduzem os efeitos do clima em decisões concretas de investimento, crédito, seguros e governança. O objetivo é claro: preparar organizações para prosperar em um mundo onde o capital natural e o capital financeiro são indissociáveis.

O século XXI inaugura a era da economia regenerativa, em que valor e sustentabilidade caminham juntos. O capital mais escasso do futuro não será o financeiro, mas o ecológico. A estabilidade dos mercados dependerá, em última instância, da estabilidade dos ecossistemas. É por isso que compreender o risco climático é mais do que uma obrigação regulatória — é uma questão de sobrevivência econômica e de visão estratégica.

A Climate4 Finance acredita que o futuro das finanças está na capacidade de ler o planeta como um sistema econômico vivo. E é justamente essa leitura — precisa, técnica e inteligente — que guiará as decisões das empresas que desejam liderar a transição para uma economia de baixo carbono, resiliente e regenerativa.

Referências bibliográficas

IPCC. Sixth Assessment Report (AR6): Impacts, Adaptation and Vulnerability. Genebra: IPCC, 2023.
TCFD. Recommendations of the Task Force on Climate-Related Financial Disclosures. Financial Stability Board, 2017.
ISSB. IFRS S2 Climate-related Disclosures. IFRS Foundation, 2023.
NGFS. Climate Scenarios for Central Banks and Supervisors. Banque de France, 2022.
OCDE. Climate Change and Economic Resilience. Paris: OECD Publishing, 2021.
Banco Central do Brasil. Resolução nº 139/2021: Gestão de Riscos Sociais, Ambientais e Climáticos.
CVM. Resolução nº 193/2023: Divulgação de Relatórios de Sustentabilidade.
Banco Mundial. Country Climate and Development Report: Brazil. Washington, 2023.